Por Elizabeth Faria e Elaine Saboya
Desde 2011, são seis medalhas em Campeonatos Mundiais (dois ouros, duas pratas e dois bronzes, nas distâncias de 5km, 10 km e 25km), 18 pódios internacionais consecutivos. Começou a se destacar no País aos 13 anos e não parou mais. Virou unanimidade em favoritismo de pódios, e nada perturba seu jeito simples e alegre.
Ana Marcela Cunha tem pouca idade (apenas 24 anos), é uma celebridade mundial no esporte, mas nada afeta seu estilo único, de simplicidade no trato com as pessoas, de humildade e bom humor contagioso. Poucos atletas no mundo são recepcionados na entrada da cidade, na volta de um campeonato internacional, e desfilam em carro oficial pelas ruas. Mas a baiana Marcela já desfilou duas vezes em Santos e foi aplaudida nas ruas.
O único sinal visível de estrela aparece perto de grandes provas: seu cabelo muda de cor e comprimento: ora curto, ora comprido, ou raspado na lateral, já foi verde, amarelo, roxo, loiro, vermelho, laranja… Mudar o cabelo não é apenas vaidade, tem a ver com ritual para dar sorte, dizem os amigos. Sabe que precisará ser mais discreta depois que foi incluída no Programa de Alto Rendimento das Forças Armadas, mas ninguém duvida de alguma mudança e também de novas vitórias, com ou sem rituais.
Sempre calma e sorridente, Ana Marcela, ou simplesmente Marcela, como diz sua mãe com o sotaque baiano, tem um currículo extremamente vasto. Começou a se destacar no País em 2005, quando tinha apenas 13 anos – época em que estudava no Colégio Santa Cecília. Em duas oportunidad es, foi recepcionada pelas ruas da cidade de Santos, em carro de bombeiros / de som, queima de fogos e festa: em 2011, após ser a primeira brasileira a subir no lugar mais alto do pódio em toda a história do Mundial dos Esportes Aquáticos, com o ouro nos 25km em Xangai, e em 2012, quando trouxe de Hong Kong o título então inédito (bicampeã mundial) para o Brasil.
Seus feitos relevantes em sua trajetória a partir de 2011, especialmente em 2015, confirmaram o status internacional da maratonista, como grande promessa de brilhar no pódio dos Jogos Rio 2016.
“Voltei para casa”
Ana teve uma breve passagem pelo Sesi, mas retornou à Unisanta em 2015. “Voltei para casa”, disse a atleta, em 12 de novembro daquele ano, tricampeã mundial de Maratonas Aquáticas em Águas Abertas, já com vaga garantida para as Olimpíadas 2016.
“Aqui recebo boas energias e continuarei treinando para continuar a sequência de bons resultados e, assim, representar bem os 200 milhões de brasileiros”. A nadadora contou na oportunidade que, quando chegou à Unisanta, foi direto para a piscina, reconheceu funcionários e reviu colegas. “A sensação é a de voltar para casa depois de uma viagem. Minha primeira medalha de natação mundial ganhei aqui. A Unisanta me abriu as portas para a natação do Brasil e do mundo. Sou muito grata a todos”. Ela também notou que a estrutura do Parque Aquático, que já era boa, melhorou ainda mais.
Mas Ana não está de volta apenas para a Unisanta, equipe que defendeu entre 2007 e o fim de 2012. Voltou para o técnico Márcio Latuf, com quem a nadadora trabalhava quando estreou nos Jogos Olímpicos e obteve sua primeira medalha em um Mundial de esportes aquáticos. “Vou voltar. Ele [Márcio Latuf] foi o cara que começou tudo”, contou Ana Marcela em entrevista ao Uol Esporte, concedida um pouco antes de retornar à Unisanta. “É a chance de realizar um sonho que não é só meu, mas de alguém que construiu isso também” (sobre a medalha olímpica), completou.
2015/2016: a melhor maratonista aquática do mundo e melhor atleta do Brasil
O ano de 2015 também foi brilhante. Foram 11 pódios internacionais consecutivos. Foi ouro, prata e bronze no Mundial de Kazan (na Rússia), medalha de prata no evento teste das Olimpíadas do Rio de Janeiro, e naturalmente o reconhecimento veio: foi considerada a melhor maratonista aquática de todo o mundo pela Federação Internacional de Natação e também a melhor atleta do Brasil, eleita pelo Comitê Olímpico Brasileiro (COB).
Parecia que estava no auge, mas ela não parou por aí: em 2016, conquistou a medalha de bronze nos 10km da etapa de Abu Dhabi da Copa do Mundo da Fina, e, talvez, a conquista mais importante da sua carreira: a vaga para as Olimpíadas do Rio 2016.
Incluída no Programa de Alto Rendimento das Forças Armadas, agora como terceiro-sargento da Marinha do Brasil, Ana Marcela conquistou, em abril, o 18º. pódio internacional consecutivo. Foi bronze nos Estados Unidos, em prova disputada no Miromar Lake, em Fort Myers, nos 10km do Open Water National Championship, na Flórida. Poliana Okimoto, também da Unisanta, ficou com a 5ª. colocação. As duas nadadores cecilianas são as representantes do Brasil nas Olimpíadas de 2016.
Trajetória – Ana começou a treinar “pra valer” no Clube Olímpico de Natação da Bahia, aos 10 anos de idade. “Nas provas de fundo me saia melhor e, desde que nadei uma pequena travessia, gostei muito mais que nadar em provas de piscina, fiz vários Circuitos Estaduais e fui sempre me mantendo entre as primeiras colocadas”, conta a atleta.
Promissora deste muito jovem, foi convocada pela Seleção Brasileira de Piscina aos 12 anos. Em 2005, com 13 anos, já estava se destacando em competições oficiais de águas abertas, com o título de vice-campeã da Travessia dos Fortes – Rio de Janeiro/RJ. Ana atribui à paixão pela natureza a base de seu sucesso em competições no mar. “Sempre tive uma paixão diferente pelo mar e pela natureza. Aos 8 anos, já fazia travessias no mar com o apoio dos meus pais, que pediam autorização para que eu participasse das competições, uma vez que a idade mínima permitida era 13 anos”.
Em 2006, mais títulos: a mais jovem campeã da Travessia dos Fortes, com apenas 14 anos, campeã dos 10km e 5km nos Jogos Desportivos Sul-Americanos – Buenos Aires/Argentina. “Foi ali que vi que era aquilo que eu queria fazer na vida”, diz a nadadora. Até então, ela dividia o tempo também com as competições na piscina, em provas de longa distância. “Eu nadava os 800 metros em torneios como o Maria Lenk, mas em campeonatos regionais cheguei a disputar até 1.500 m (prova que no programa olímpico só existe para os homens).” (Revista Istoé – janeiro de 2016).
A mudança – “Em 2007, largamos tudo que tínhamos em busca de um sonho. Saímos de Salvador por falta de estrutura e viemos morar em Santos, e comecei a treinar na Unisanta. Aqui eu teria um lugar para estudar e nadar”. No mesmo ano, conquistou o 7º. lugar da prova de 10km dos Jogos Pan-Americanos do Rio de Janeiro.
Com apenas 16 anos, nos Jogos Olímpicos de Pequim 2008, na estreia da modalidade em Olimpíadas, conseguiu o 5º. lugar na prova dos 10km, atingiu o 3º. lugar do ranking do Circuito Mundial 10km/FINA e o reconhecimento do COB como melhor Maratonista Aquática do Brasil – Prêmio Brasil Olímpico.
Em 2010, chegou ao topo do Circuito Mundial (campeã) e foi eleita pela Federação Internacional de Natação (FINA), pela primeira vez, a melhor nadadora do mundo. Mas as homenagens não pararam por aí. Ana ganhou, no mesmo ano, o prêmio do COB (segunda vez).
Superação – Em 2011, com certeza, foi um dos anos mais marcantes na carreira de Ana Marcela. A atleta perdeu a vaga Olímpica para Londres – 2012, por três segundos e uma posição na prova dos 10km, mas na mesma competição, foi a primeira brasileira a subir no lugar mais alto do pódio em toda a história do Mundial dos Esportes Aquáticos, com o ouro nos 25km em Xangai.
“Naquele dia, eu saí para andar e conversei com ela (Ana) sobre o que é a vida e o esporte. Busquei mostrar para ela que esse Mundial, que não estava bom para ela, poderia se tornar um ponto máximo. Que ela ainda é nova e ainda teria mais duas provas. E em poucas horas, ela voltou ao normal, treinou forte e conseguiu a medalha de ouro na última prova (25km)”, contou o técnico Márcio Latuf ao Jornal Boqueirão News, na oportunidade.
“Saí do inferno ao céu. Fiquei triste quando acabou, mas decidi partir para outras provas. Se eu tivesse me classificado nos 10km talvez não estivesse com a medalha de ouro da Maratona de 25km”, afirmou Ana Marcela.
Em 2012, sagrou-se bicampeã do Circuito Mundial (FINA) e pela 3ª. vez foi eleita pelo COB como melhor Maratonista Aquática do País. A consagração continuou em 2013, com a prata na prova dos 10km e bronze na de 5km no Mundial de Esportes Aquáticos, em Barcelona.
Em 2014, decidiu correr atrás de uma nova meta: conseguir medalhas em todas as oito etapas do circuito da Copa do Mundo e, assim, realizar um feito inédito, pois nenhum campeão havia chegado ao título tendo conquistado medalhas em todas as etapas. Objetivo alcançado e mais dois títulos no currículo: foi escolhida, pela segunda vez, pela FINA como a melhor nadadora de maratonas aquáticas do mundo e, pela quarta vez, recebeu o Prêmio Brasil Olímpico do COB, em Maratonas Aquáticas. Outro feito histórico da atleta neste ano foi a quebra do recorde dos 36km da Travessia Capri-Napoli, além do octacampeonato brasileiro.
Instituto Ana Marcela: ajuda ao próximo – A atleta transformou sua paixão pela água em fonte de vitórias, reconhecimento e inspiração para ajudar os outros: em 8 de junho de 2016, Dia Mundial dos Oceanos, lançou o Instituto Ana Marcela, no Consistório da Unisanta, ao lado de seus pais, George Cunha e Ana Patrícia Cunha.
Seu objetivo é disseminar sua expertise em Maratonas Aquáticas, por meio de convênios com prefeituras, clubes e associações, para atender crianças e adolescentes em idade escolar, que tenham o desejo de encarar o desafio de aprender a nadar. A metodologia Ana Marcela de Maratona Aquática será projetada para ir além da formação da atividade de natação.
As primeiras ações do Instituto estão previstas para o segundo semestre deste ano. “Vamos organizar dois eventos que prepararão os circuitos que estamos organizando para 2017. Realizaremos uma prova em mar aberto e um Festival de Maratona Aquática Urbana, que tem como objetivo utilizar as técnicas aplicadas no mar em uma piscina sem raias”, conta George.
Marcelo Teixeira, pró-reitor administrativo da Unisanta, foi convidado para ser o patrono do Instituto Ana Marcela e ir unir forças com a equipe da atleta visando aprovar um projeto de lei que oficializará o dia 23 de agosto como o Dia Nacional da Maratona Aquática.
Futuro – Ana, que tem como hobby ir ao cinema, praia, interagir nas redes sociais, frequentar restaurantes de comida japonesa, sonha em se formar na Faculdade de Educação Física. “Estou com matrícula trancada no Curso de Educação Física da Unisanta, mas quero retomar meus estudos após as Olimpíadas do Rio”.
E falando em Olimpíadas, a atleta, que é uma das esperanças mais fortes de medalhas para o Brasil, segue muito confiante. “Estou consciente de meu potencial, me sinto super preparada e feliz com cada etapa concluída, e vou sim para brigar pelo pódio, essa é a minha meta, do meu técnico e de toda a minha equipe multidisciplinar, vamos à busca de uma medalha”.