Docente da Unisanta participa de decisão que derrubou as restrições à doação de sangue por homossexuais

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Em um julgamento histórico, o Supremo Tribunal Federal decidiu derrubar as restrições à doação de sangue por homens gays, declarando como inconstitucionais as normas do Ministério da Saúde e da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que vigoravam até então. E a Universidade Santa Cecília se fez presente neste processo com a participação fundamental da docente, Patricia Cristina Vasques de Souza Gorisch,  que fez as peças de amicus curiae (amigo da corte) para o STF, embasando as decisões dos ministros com dados científicos e jurídicos sobre o assunto.

Santista e ceciliana orgulhosa, Patricia foi aluna do Colégio Santa Cecília desde os três anos de idade. “Existe uma trajetória na nossa vida e não podemos negar, e eu sou filha da casa”, comenta a professora, que conquistou um currículo invejável desde então. Graduada em Letras e Direito, neste último também conta com mestrado, doutorado e dois pós-doutorados no exterior, em Direito da Saúde, na Itália, e em Direitos Humanos, em Salamanca (Espanha), ainda em andamento. Também estuda Jornalismo, o que ela define como sua “grande paixão”.

Atualmente é professora da Faculdade de Direito, do curso de Psicologia, da Pós-Graduação EAD e do Mestrado em Direito da Saúde da Unisanta, além de coordenar o Observatório dos Direitos do Imigrante da instituição e encabeçar entidades como a Associação Brasileira de Famílias Homotransafetivas (ABRAFH), que ela mesma fundou, e o Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), no qual atua como diretora nacional.

E foi por meio destas duas últimas organizações que Patricia participou do julgamento do Supremo Tribunal Federal: “Quando um partido político, o PSB (Partido Socialista Brasileiro), ingressou com essa ação no STF, existia a possibilidade de associações e institutos entrarem como amicus curiae[…]com dados científicos, dados jurídicos, para embasar as decisões dos ministros[…]” explica a docente da Unisanta, que fez a sustentação oral pelo IBDFAM.

A partir de então, Patricia e os outros envolvidos iniciaram uma vasta pesquisa para elaborar a sustentação oral de forma clara e embasada, deixando nítida a injustiça, o preconceito e o atraso das normas vigentes para a doação de sangue por homossexuais. A professora aponta como cerne de toda a questão o emprego de um juízo de valor equivocado: “Tanto a premissa da OMS (Organização Mundial da Saúde), quanto a do Ministério da Saúde são falsas. Elas colocam como se as pessoas LGBTI fossem promíscuas, e a promiscuidade é do ser humano, tem pessoas que são, tem pessoas que não são”.

As legislações prévias da Anvisa (por meio da Resolução RDC nº 34/14) e do Ministério da Saúde (Portaria nº 158/16) determinavam que homens que mantiveram relações sexuais com outros homens nos últimos 12 meses teriam a doação rejeitada pelos bancos de sangue.

Patrícia divergiu de tais decretos usando de suas experiências pessoais. Ela compartilhou sua satisfação quando, ao doar sangue na Santa Casa de Santos, recebeu um cartão escrito: “Você salvou seis vidas.”, e sua indignação de viver em um país onde tal oportunidade de cidadania é ceifada de homossexuais pelo simples fato de serem homossexuais. “Não existe um rigor científico, é um mero preconceito”, relata Patricia, sobre tal realidade.

A docente da Unisanta ainda destrinchou as raízes históricas na elaboração de uma lei excludente como a anterior, destacando todo o misticismo com o qual algumas culturas relacionavam o sangue a pureza ou a superioridade genética, como é o caso de tradições monárquicas europeias, que diziam que o rei tinha o sangue azul. Ou da estratificação social indiana, que relaciona a superioridade ou inferioridade das castas com o sangue dos seus componentes. Caracterizando, em ambos os casos, como maléfica a miscigenação sanguínea de indivíduos socialmente diferentes. Nem o descobrimento dos grupos sanguíneos no século XX, pelo austríaco Karl Landsteiner, foi capaz de aniquilar tal pensamento.

O julgamento, que começou em outubro de 2017, foi interrompido por pedido de vista do ministro Gilmar Mendes e só foi retomado pela necessidade urgente do aumento da doação de sangue durante a pandemia da COVID-19, pela possibilidade de tratamento dos infectados pelo novo coronavírus com o plasma de pacientes já curados. A chamada doação de anticorpos, que ainda está sendo monitorada pelo Ministério da Saúde.

Em plenário virtual, no dia 08/05 (sexta-feira), o STF derrubou, com uma maioria de votos (7 a 4), a restrição da doação de sangue por homossexuais. Patricia comemorou de casa a tardia decisão e se orgulha ao pensar em sua contribuição no julgamento: “Logo depois que eu terminei de falar, um jornalista da Folha de S. Paulo, gay, chegou perto de mim e disse que amanhã já iria doar sangue”, relembra a professora.

Por fim, Patricia Gorisch não economiza agradecimentos à sua instituição formadora, a Universidade Santa Cecília, por sempre fomentar a luta pelo que é correto por meio do conhecimento e pelo privilégio de poder passar aquilo que aprendeu para seus alunos. Ela ainda destaca o protagonismo que o poder judiciário brasileiro vem tendo no caminho pela igualdade de direitos entre cidadãos de qualquer orientação sexual.