O Congresso termina nesta terça-feira à noite,  com palestras do  Promotor de Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo, Dr. Ivan da Silva,  e do   advogado criminalista,  Dr. Guilherme Alfredo de Moraes Nostre.

cobertura de Christian Miranda e Elaine Saboya

O desastre ecológico de Mariana, considerado por alguns estudos como a provável causa do surto de febre amarela no sudeste, foi um dos assuntos abordados na palestra  do Promotor de Justiça   do Tribunal do Júri da Capital e Assessor da Escola Superior do Ministério Público,  Dr. Alexandre Rocha Almeida de Morais, na abertura  do XVII Congresso de  Direito  Ambiental da Universidade Santa Cecília (Unisanta), na noite de segunda-feira (21/5).

O surto da doença teria sido provocado pelo descontrole completo  do bioma, devido ao derramamento da lama com produtos perigosos.  Um dos efeitos foi a proliferação dos mosquitos e as doenças transmitido por esses insetos,  que são os hospedeiros da febre amarela.

“O derramamento da lama acabou com toda a população (fauna e flora) do entorno. Mais do que isso, é interestadual, porque acabou atingindo o Espírito Santo e, o  mais relevante é que as pessoas que estão distantes nem se dão conta, nós todos somos vítimas,  simultaneamente”, afirmou o dr. Almeida de Moraes.

“Mariana é um símbolo do que é um desastre ecológico, ele não diz respeito só à fauna e flora, é um problema de saúde,  antes de tudo, ele é um problema social”, explicou.

Lembrou que muitos estudos apontam que o surto de febre amarela começa pelo desastre em Mariana. Foram adotadas algumas medidas de caráter administrativo. Existem ações ajuizadas, mas “é uma ação tão complexa,  porque é difícil de mensurar o prejuízo do dano individual, material, dano moral coletivo, o dano social”.

No caso  de Mariana, nem todos os prejudicados puderam reivindicar seus próprios direitos. A única punição que a empresa teve foi o pagamento de multas.  Isso pode gerar e desencadear problemas de suporte até para a empresa continuar funcionando, e isso é grave, “porque se ela parar completamente, as chances de ela indenizar as famílias e as pessoas que foram lesadas não vão existir”.

Responsabidade da pessoa jurídica

Segundo o palestrante, a Lei 9.605/98 tem tese e novidades importantes de 20/30 anos para cá, regulamentando a Constituição da República. Ela  tem a ideia de responsabilidade penal da pessoa jurídica. Porque nem sempre a vontade do sócio – gerente coincide com a vontade da pessoa jurídica.

“É  possível que um sócio seja voto vencido, mas,  sepor maioria,  o conselho tomou a decisão, isso justificaria a pessoa jurídica de ter uma vida própria e personalidade própria e, portanto,  responder por isso. “Mas,  na prática,  as medidas de natureza penal para a pessoa jurídica são similares às do Direito Administrativo, como fechamento das atividades, suspensão pagamento de multa e etc. A empresa (no caso de Mariana),  só ficou no pagamento de multa”.

Evolução

Para o promotor de Justiça, Alexandre  Rocha Almeida de Morais, a Lei   de Crimes  Ambientais já é uma evolução, porque,  até então, a lei brasileira tratava esses crimes  como infração menor,  como contravenção penal. “Evoluir essas infrações para crime já é um sinal importante, pois a tutela jurídica passou a ser feita para a fauna, a flora, o patrimônio cultural e artístico”.

“É uma evolução de algum modo, acho que talvez, o mais importante dessa lei, é ter dado um recado de que é preciso pensar em uma forma global, cosmopolita,  a questão do meio ambiente. Isso não é um problema só de ambientalistas, ele envolve direitos sociais, questões políticas, questões jurídicas não só no ramo do Direito Penal em sentido escrito, Direito Administrativo e Direito Civil”.

Em 1995, o Brasil regulamentou um artigo da Constituição da República e criou uma Lei, que é conhecida como Lei dos Juizados Especiais, que criou uma espécie de ficção, segundo o promotor.

“Essa ficção é o conceito de menor potencial ofensivo. Para a lei brasileira, menor potencial ofensivo é qualquer infração penal cuja pena máxima seja de até dois anos. Isso significa dizer que a gente presumiu de uma forma fictícia, que é pequena a infração por conta da quantidade de pena, não pelo bem da vida do protegido”.

“Se fosse pensado de outra forma, muito provavelmente várias infrações ambientais não teriam como objeto a aplicação da Lei dos Juizados que permite, dentre outras coisas, transação penal e outras medidas despenalizadoras. Vamos deixar claro, é possível que até em alguns casos isso seja razoável e proporcional, mas para grandes desastres ecológicos, crimes praticados de forma intencional, me parece que as sanções da Lei  são insuficientes”.

Legado para as próximas gerações

Para o Promotor Alexandre Rocha Almeida de Morais, meio ambiente é uma questão que é regida não propriamente para as pessoas que estão nesse tempo social, nessa geração, é um legado para a próxima geração. “Essa é uma ideia de solidariedade,   de um espírito republicano cívico de pensar, é um legado de  proteção para gerações futuras”.

“Isso significa dizer que é óbvio que a indenização é um mal necessário em termos não só de reparação, de compensação, mas é preciso que outros mecanismos sejam adotados. Porque é difícil você conseguir restaurar o meio  ambiente no estado anterior que se encontrava quando você tem uma grande intervenção do homem. Ao longo da história, grandes historiadores já contaram isso,  onde o homem interviu, deixou um estrago que não foi propriamente recomposto.

Além da recomposição propriamente dita, o promotor afirma que seria necessário criar no Brasil uma cultura que existe em outros países,  de uma modulação do tamanho de penas, de quanto deve ser indenizado, o calculo do dano moral coletivo. O direto anglo-saxônico, por exemplo, os judiciários dos Estados Unidos, do Canadá, da Inglaterra,  já modularam o tamanho do dano ambiental e em que medida isso pode ser proporcionalmente aplicado. Essa é uma medida que deveríamos adotar aqui.

Outras medidas importantes: fiscalização eficiente, mais controle das pessoas jurídicas que são poluidoras ou que degradam o Meio Ambiente. A título de exemplo, o Promotor recomenda que as sanções em caráter administrativo de fechamento e suspensão das atividades sejam  rápidas, “sob pena de plantar e cultivar uma sensação e sentimento de impunidade. E isso não tem acontecido”.

“Eu acho que o grande recado não é propriamente falar de um crime A ou B,é deixar um recado de como este tema diz respeito à construção da nossa história democrática. “A gente tem uma constituição de papel que ainda está tentando se tornar concreta, real e viva.  Um dos princípios importantes e objetivos dessa constituição democrática é o espírito republicano, uma coisa tão singela que a gente precisa mudar de cultura em pequenos gestos”.

“Ninguém pega um lixo, por exemplo, que está dentro do carro, chega à própria casa e joga em casa, mas a gente faz isso na praça pública, em via pública, na rua… Isso significa que tem um sentido importante de a gente refletir, a gente não trata a coisa pública, a praça, a rua, em um regime de condomínio, como se pertencesse a todos. Isso é um sentimento importante para entender o significado da própria palavra “república”,  que é coisa pública”.

“Então, é preciso entender meio ambiente como algo que não é para sua própria geração e eu acredito nos jovens para fazer isso, porque as gerações antigas não tinham isso em perspectiva. Esse é um recado importante para cultivar, fomentar, e consolidar essa visão e respectiva democrática.

Importância das pesquisas do Mestrado

Segundo a Organização Mundial da Saúde, cada  dólar investido em saneamento básico (água, sistemas de esgotos, resíduos sólidos) resulta em uma economia de  $4,3 (quatro dólares e três cents),  que seriam gastos na área da saúde, se não houvesse  saneamento.

A informação é do Prof. Dr.Fernando Akaoui, coordenador da Faculdade de Direito e do Mestrado de Direito da Saúde da  Unisanta. Durante o XVII Congresso de Ambiental aberto na noite de segunda-feira (21/5),  o dr. Akaoui mencionou  dissertações de mestrado que estão sendo elaboradas na Unisanta abordando diversos problemas ambientais que impactam a saúde humana, como os agrotóxicos.

Os estudos dos mestrandos, orientados por professores, estão possibilitando identificar fontes e sugerir soluções, a fim de minimizar os impactos nocivos que os poluentes possam afetar a saúde humana. Um desses estudos está sendo elaborado com a prefeitura de Santos.

 Pioneirismo da Unisanta            

O dr. Akaoui  lembrou que a Unisanta tem uma história de décadas de estudos na área ambiental, “sobre temas extremamente relevantes”. Foi pioneira ao introduzir a disciplina Direito Ambiental no quinto ano da Faculdade.

O Mestrado de Direito da Saúde também é pioneiro no País, ao estudar os impactos da degradação ambiental na saúde humana, desde a falta de saneamento básico, uma das causas da mortalidade infantil,   à poluição atmosférica que mata milhares de pessoas, à poluição sonora, às ondas eletromagnéticas etc.

Programa desta terça-feira

Nesta  terça-feira (22/5). no encerramento do Congresso de Direito Ambiental, às 19h30, o  mestre em Direito Ambiental e Promotor de Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo, Dr. Ivan da Silva,  abordará o tema “Juizados Especiais e Criminais e Crimes Ambientais”.

Às 20h30,  a palestra será sobre  “Crimes de Perigo na Lei 9.605/98”,  a cargo do Dr. Guilherme Alfredo de Moraes Nostre. Ele é mestre e doutor pela USP,  advogado criminalista e sócio do Escritório Moraes Pitombo.

O evento será realizado no Anfiteatro do Bloco E da Universidade. Para mais informações e efetuação da inscrição acesse o seguinte site.