A presença de peixes da espécie Oreochromis niloticus – tilápia do Nilo, de origem africana, própria de água doce, ao longo dos canais de Santos, é uma surpresa que chamou a atenção de pesquisadores da Universidade Santa Cecília (Unisanta), em Santos, e pode ser uma ameaça.
A pesquisa inédita, iniciada em maio, tem importância fundamental para a comunidade santista, pois o que acontece nos canais está diretamente ligado à saúde publica, destaca Matheus Rotundo, pesquisador da Universidade.
Entre os séculos XIX e XX, lembra o biólogo, o lebiste ou barrigudinho (Poecilia reticulata) – peixe de 3 a 6 centímetros, muito utilizado em aquários, foi introduzido nos canais devido ao seu hábito de se alimentar com larvas de insetos, servindo como ferramenta de controle biológico, combatendo os transmissores de doenças.
Segundo o pesquisador, com a descoberta de tilápias nos canais, o lebiste passa a correr risco de ter sua população reduzida, que hoje é de 60% das espécies de peixes existentes no local. Rotundo explica que as tilápias têm amplo espectro de alimentação. Ao analisar o estômago de tilápias coletadas, foram encontrados exemplares de lebiste. “A redução dos lebistes pode contribuir para o aumento de larvas de mosquitos como o Aedes aegypti, uma vez que são controladores de vetores”.
Outra conclusão parcial das pesquisas diz respeito às aves que se alimentam dos peixes do canal. “Agora, essas aves têm competidores de alimentação, as tilápias, que estão se adaptando a esse microhabitat muito bem”. Com o programa de balneabilidade das praias, as comportas dos canais ficam mais tempo fechadas, impedindo a entrada de água salgada e mantendo o ambiente ainda mais propício para os peixes de água doce, como as tilápias, acrescenta.
De acordo com a pesquisa, que busca fazer o levantamento das espécies presentes nos canais santistas, a tilápia está se adaptando a esse diferenciado e complexo microhabitat, que sofre interferência das águas do mar, períodos de seca, pressões dos predadores naturais, sem contar a presença de todo o tipo de lixo.
Rotundo revela que durante as coletas de material e água nos canais para posterior análise no Laboratório de Pesquisas Biológicas e no Laboratório de Ecotoxicologia da Universidade, o grupo se deparou com objetos como garrafas PET, colchão, isopor, restos de oferendas religiosas, fezes humanas e até esgoto clandestino. Um cenário impróprio para qualquer animal aquático, afirma.
Alerta – O biólogo faz um alerta em relação à prática da pescaria junto aos canais. “A pesca não é aconselhável, nem das tilápias ou de peixes como o robalo, tainha e parati, que foram localizados ao longo dos canais 6 e 7, principalmente, devido à troca com a água do mar. Isso porque eles podem ter se contaminado com vários tipos de substâncias ou organismos tóxicos.”
Além de analisar peso, comprimento e a quantificação dos peixes, os estudo identifica crustáceos, moluscos e aves desse ambiente. Para tanto, as alunas de Biologia Marinha da Unisanta, Carina Valério e Jéssica Massunda, e o técnico de coletas Marcelo Croce monitoram 19 pontos de amostragem, do canal 1 ao 7.
Há medições próximas ao mar após as comportas, na parte mediana da extensão do canal e próximo à região estuarina, onde são analisados itens como ph, salinidade e temperatura da água.